Os porcos Moura, que quase sumiram do Paraná há 20 anos devido ao encerramento de centros de conservação da raça, atualmente ganham espaço no estado com o trabalho de pequenos produtores espalhados em várias regiões.
A raça se diferencia principalmente pelo modelo de criação, que precisa ser feito em menor escala, e também pelo tipo de alimentação desses animais, que por serem criados livres, possuem um atrativo de mercado diferenciado.
Divo José Molinari tem um sítio em Irati, região central do estado, onde cria 38 porcos da raça Moura.
O conhecimento que ele adquiriu sobre os animais o levou a presidência da Associação dos Criadores de Porco Moura do Paraná (ACPM), lançada em 2019 e oficializada em 2022 com apoio do Sebrae e da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Atualmente, 34 criadores estão associados.
Para ele, um dos principais diferenciais da carne da raça é o sabor.
“Nós enquanto criadores estamos tentando nos organizar enquanto associação e ganhar mercado. Acreditamos que o mercado precisa dessa proteína de qualidade. Produtos como banha e carne na lata podem ser resgatados. Às vezes os criadores não têm paciência para esperar, mas precisamos dar um passo de cada vez. Não é fácil, mas estamos avançando”, afirmou.
O professor do departamento de Zootecnia da UFPR, Marson Bruck Warpechowski, explica que a raça Moura integra um grupo conhecido por “raças crioulas”.
Em 1985, uma iniciativa da universidade incentivou a conservação e multiplicação de porcos dessas raças no estado, porém, foi encerrada em 2002. Com isso, a raça quase sumiu. Em 2014, a iniciativa foi resgatada para incentivar a produção e assim nasceu o Projeto Porco Moura.
“Desde o início, procuramos fortalecer os criadores de subsistência para continuarem sendo repositores de genética, não só de Moura, mas de todas as raças crioulas brasileiras, porque todas estão em extinção. Reconstruir o pouco que sobrou do sistema é muito difícil, mas quem já comeu uma vez entende por que tudo isso é feito. É muito diferente”, explica Warpechowski.
Diferença das raças industriais
Diferentemente das raças industriais, os porcos Moura são criados soltos, em pastagens e áreas de mata nativa. A alimentação desses animais é o que está disponível na natureza, incluindo sementes como o pinhão, por exemplo
A junção destes fatores resulta, conforme explica o professor Warpechowski, em uma carne com um sabor diferenciado, além de um marmoreio que se compara às carnes bovinas da melhor qualidade.
Por conta destas especificidades, estes animais não podem ser criados em larga escala.
“Talvez o criador pequeno tenha uma situação tão única e que gere um produto tão valioso que a questão não é de quantidade, é de garantir a qualidade. É que nem uma obra de arte, não é questão de fazer várias, é questão de fazer uma muito boa, uma que todo mundo queira comprar e que se torne valiosa”, exemplifica o coordenador do projeto.
Competição no mercado
Em Guarapuava, na região central do estado, a produtora Makelle Oliveira Dalla Rosa cria a raça em um rancho. Ela entrou neste segmento em 2020, quando adquiriu as primeiras matrizes. Hoje ela possui 25 porcos Moura, incluindo leitões, a matriz e o reprodutor.
No caso de Makelle, ela aposta na raça para produção de torresmo e carne de lata, seguindo um modelo que era executado pela avó.
Apesar de ter afeição pela raça, Makelle explica que há desafios na criação. Um deles é tirar a resistência do consumidor à raça.
“A parte mais difícil é a aceitação. Uma pessoa hoje vai no açougue e olha os dois cortes, um com gordura e um com sem, mesmo que na panela o sem gordura fique duro e sem sabor, é esse que a dona de casa vai preferir. Então a maior dificuldade é colocar esses animais no mercado”, diz, animada.
O professor Warpechowski explica que outra dificuldade para estes produtores é quanto a parte técnica, nos frigoríficos. Segundo ele, o abate destes animais exige processos mais demorados e, por consequência, mais caros.
“Abater 2, 3, 4 ou 5 animais em frigoríficos certificados é muito difícil. Primeiro porque eles têm uma estrutura desenhada pra grandes quantidades. Colocar um lote pequeno gasta a mesma coisa e atrapalha os outros lotes. Em segundo lugar, esses porcos têm um processo de limpeza, carregamento e bem-estar animal diferenciado. Tem que parar o abatedouro para abater um porco. Temos conseguido fazer, mesmo que eles cobrem três vezes mais”.
Apesar dos desafios, a perspectiva é de um cenário positivo. Charles Ortiz Novinski, fundador de uma consultoria que faz rastreabilidade de carne de porcos Moura, explica que hoje os produtores estão conseguindo enfrentar o gargalho da comercialização.
A empresa dele, por exemplo, faz a ponte entre o produtor e o mercado consumidor. Atualmente, cinco produtores de Tibagi, Guarapuava, Palmeira e da Região Metropolitana de Curitiba são acompanhados pela empresa.
“O grande gargalo era a comercialização, não conseguiam vender a produção. Não existia frigorífico que comprava, porque o mercado é diferenciado. Empresas compradoras depreciavam o produto porque era diferente do produto industrializado. Fui buscar comércio para eles, fazer parcerias com abatedouros e indústrias de desossa.